4.16.2004

I put a spell on you
A entrada na cidade faz-se a grande velocidade, atravessando múltiplas e invisíveis vias verdes que fazem debitar na conta do condutor taxas de penetração de valor elevado. Ruas largas, árvores, muito verde e muito branco das casas coloniais e do seu reflexo em arranha-céus de vidro que com aquelas alternam. Um hotel que ocupa um quarteirão inteiro, também branco, também colonial, é um ponto de chegada. Nesta cidade que também é Estado, convivem numa aparente harmonia cristãos, hindus, muçulmanos, europeus e orientais do próximo, médio e extremo oriente, todos vestidos como lhes apetece segundo os seus costumes e religião. Consta que há muitas coisas que são proibidas, mas não é visível o mínimo sinal de repressão ou sequer de prevenção. O que há é muito calor, mas a vida desenrola-se como se não vivêssemos neste tempo, neste planeta. É tudo muito limpo, arrumado e civilizado, dos passeios imaculados que se podem percorrer com a língua até ao famoso bar do hotel onde há anos é mantida a tradição de atirar as cascas de amendoim para o chão.
Canas de bambu, um calor húmido e insuportável, cadeirões de palhinha, um longo parapeito branco que acompanha uma varanda em forma de corredor, entrecortado por colunas altas que a sustentam. Num quarto, no tecto, por cima da cama, uma ventoinha rodando num círculo de diâmetro considerável ameaça cair e esquartejar dois corpos já em baixa tensão. Na nossa cabeça e por cima dela, a ventoinha, de objecto essencial à respiração passa a objecto ameaçador. A ventoinha é a mesma, o motor que a faz rodar também. O princípio do Apocalipse. Now. Não, o fim de uma tarde.

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