4.26.2004

direito de resposta

(a propósito de um artigo no Expresso de há duas semanas, no qual sou caracterizado como um optimista. E a propósito da Evolução)
Não sou um optimista. Sou realista e, por essa razão, raras vezes sou optimista. Não tenho grande confiança na retoma. Tenho pouca esperança na melhoria da produtividade. Acho que em Portugal continua a trabalhar-se pouco e mal, e a educar-se pior. Acredito pouco no desenvolvimento económico de Portugal nos próximos anos, porque sei que o país não está preparado para tomar medidas necessárias para desenvolver-se, pelo menos ao ritmo desejável. E como não está preparado, faz bem em não tomá-las. (Só um exemplo: Portugal não está preparado para aguentar as consequências sociais do desemprego que resultaria do emagrecimento do Estado, sendo que o emagrecimento do Estado é uma das medidas fulcrais para um mais rápido crescimento económico).
Reconheço todos estes males. No entanto, a minha paciência para o excesso de lamentações e lamúrias definitivas sobre o estado do País tem diminuído. Tem diminuído muito. ‘Isto está mal’, ‘Isto está cada vez pior’, ‘Só faltava mais isto’, ‘Batemos no fundo’, etc., etc., etc. – São frases que hoje, à esquerda, à direita e ao centro são recorrentemente ditas a propósito de tudo e mais alguma coisa, às quais se segue um atirar de culpas nas mais variadas direcções.
Culpa do estado a que chegamos. Culpa do Estado e da sociedade civil que é fraca; culpa de quem manda, de quem obedece e de quem não obedece; das leis e da sua aplicação; do governo, dos patrões, dos sindicatos, da oposição e da falta dela; do povo, da televisão, do Salazar, do 25 de Abril, do Cavaco e do Soares; do PREC, da descolonização, da ditadura e da guerra em Africa; da globalização, da Europa, do mundo. Das portuguesas, dos portugueses e de Portugal.
Todos (eu incluído) atribuem culpas aos mais diversos culpados. Excepto ao tempo. Excepto ao tempo que leva pôr direito aquilo que estava torto. Por mim, cada vez mais me inclino para considerar que a principal culpa do nosso atraso é do tempo que falta para o nosso desenvolvimento. O tempo é essencial para ultrapassar certos obstáculos. Para muitos que nos faltam é preciso tempo. Não há política que ultrapasse isso. Pode encurtá-lo ou dilatá-lo, mas nunca irá supri-lo.
Por isso, apesar de não ser um optimista, não gosto de ouvir as recorrentes frases pessimistas. ‘Isto está mal’, ‘Isto está cada vez pior’, ‘Só faltava mais isto’, ‘batemos no fundo’, etc., etc., etc.
Não é verdade. Mesmo havendo verdade em muitas das queixas que levam a estes desabafos, não é verdade que isto esteja cada vez pior. Mais, se comparado com o que era num passado próximo, isto está cada vez melhor. Portugal está muito melhor hoje do que há 30 anos, ou há 31, ou 29 anos. Independente de todos os cenários negros que são traçados, de todas as estatísticas e índices que nos atiram para a cauda da Europa e de todos os diagnósticos do Medina Carreira ou de outros com quem em quase tudo concordo, os portugueses vivem muito melhor agora do que antes. Para muito mais gente é muito melhor viver no Portugal de hoje do que no de há 30 anos. Digo-o as vezes que forem necessárias. Não é preciso ter vivido nessa altura para sabê-lo, basta não ser quadrado.
Nos últimos 15/20 anos, um elevadíssimo número de portugueses passou a ter acesso a coisas tão simples como comida, água canalizada, electricidade, gás, informação, transportes, casa, férias, bens supérfluos e tantas outras coisas que hoje, felizmente, são dados adquiridos para muitos. Para já não falar de outras alterações, mais importantes até, que me levariam a uma outra discussão na qual agora, por falta de tempo, não me interessa entrar. Reconheço que falta muito para sermos o que queremos ser, mas isso não invalida que hoje se viva melhor.
Quero que fique claro que não sou um optimista quanto ao futuro. Mas estou mais do que convencido que desde 1974 se avançou muito em pouco tempo. Ou, dito de outra forma, se evoluiu muito.


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