4.14.2004

a América. De mota e parada, em silêncio e a conversar, a chupar e a fumar



Anos houve em que fui incapaz de perder um número que fosse da Inrockuptibles. Mensalmente - primeiro - e semanalmente - a seguir - lá ia eu à loja das revistas agarrar num exemplar que, em grande parte, furiosamente consumia. Depois, o hebdomadaire começou a aventurar-se com não pouca regularidade na oferta de opinião política, área na qual, ao contrário do que sucede relativamente à crítica de música e cinema, os franceses são, e cada vez mais estão, assustadoramente correctos - politicamente correctos. Havia números que mais pareciam panfletos do protocolo de Quioto ou de um qualquer fórum mundial em Belo Horizonte. Comecei, assim, a perder a paciência para a revista e aos poucos fui deixando de comprá-la.
Há, porém, edições da Inrockuptibles que devem em absoluto ser lidas. É o que se passa com a da semana passada (ainda à venda num quiosque de qualidade perto de si) na qual posam para a capa Vincent Gallo e Jim Jarmush – les dandys du cinema américain.
Vincent Gallo, melhor em entrevista do que em filme – Brown Bunny apenas vale pela música (Honey and milk, de Jackson C. Frank, merece ser conhecida) e algumas imagens da América vista por detrás do vidro sujo de uma carrinha (a cena final é constrangedora, não por ser o que é, mas por ser narcisicamente perra e enferrujada) –, atira-se ao actual cinema francês (Je trouve ses filmes incroyablement emmerdants, boursouflés, banals. Encore un pédé européen chiant – diz referindo-se a Patrice Chéreau), a Mel Gibson (...est un fanatique religieux, pas un homme politiquement de droite), aos eleitores do Partido Democrata (Ces gens-lá sont ceux qui vont voir les films commerciaux, qui ragardent la télé de merde, qui achètent dês fringues pourris, etc.) e à demagogia eleitoral da esquerda (Un polititien de gauche se presente et dit aux pauvres “Les républicains vont s’emprer de votre médecine, ils vont prendre votre argent pour donner aux riches”, il dit aux Noirs “Les Blancs vous ont domines pendant les anées”, il dit aux pédés “Vous méritez plus droits”. Comme si les homosexuels étaient opprimés en 2004!), fintando sempre com habilidade as provocatórias perguntas de Serge Kaganski, um dos melhores críticos de cinema de sempre - um dos mais militantemente esquerdistas, porém.
De Jim Jarmush (um verdadeiro grande nome do cinema independente) é feita a antevisão do próximo filme Cofee and Cigarettes. Neste, Jarmush junta o habitual gang – Tom Waits, Steve Buscemi, Roberto Benigni, Iggy Pop – à volta de uma mesa de café, e acrescenta-lhe mais alguns nomes como Cate Blanchett, Bill Murray e os inesperados - ou talvez não - White Stripes. Um filme onde não há silêncios martirizados, nem broches, e as conversas andam à volta de coisas banais, como Paris nos anos vinte, Nikola Tesla – o inventor do radar –, as medicinas alternativas ou o uso da nicotina como insecticida.





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