10.30.2003

Homenagem para a posteridade à Le Due Cupole Grande
A Due Cupole Grande é uma miúda que conheço, só de vista, da ginástica.
É loira, para o gordo, mais para o grande, como aquelas mammas italianas que aparecem a espreitar do balcão de um forno com uma piza gigante na mão. É muito branca, com pele de bifa e sardas. E, como o próprio nome indica, tem duas cúpulas grandes.
Embora eu conheça a Due Cupole do ginásio (só de vista, hã!. Bom...), nunca a vi a fazer ginástica. Due Cupole, quando lá está, está no restaurante, a comer, a estudar direito nos vários calhamaços de capa branca com faixa encarnada e a conversar, sempre, sempre, com pessoas diferentes.
Todos os dias me pergunto, porque razão está esta rapariga tantas vezes no ginásio se nunca faz ginástica. Ainda não tenho resposta certa, mas já especulei sobre o assunto.
Já imaginei que fosse órfã e tivesse sido adoptada pela instituição que é o ginásio. Mas não. O ginásio só tem dois anos e não há instituições só com dois anos.
Também já me ocorreu que fosse uma espécie de atractivo para a clientela masculina, uma forma de fidelização e de angariação de novos sócios. Uma daquelas ideias de marketing dirigido ao subconsciente que de vez em quando se inventam.
E, vistas as coisas, é bem capaz de ser.
Sempre que falo com os meus amigos frequentadores do ginásio, a propósito da ginástica, a Due Cupole é, invariavelmente, o único tema.

“Então, vais lá hoje?”
“Vou. Espero que a Due Cupole lá esteja.”

“Foste lá? E ela? estava?”

“Hoje estive lá. Ela estava imponente.”

“Amanhã vou lá e vou meter conversa.”

“Vim de lá agora, e ela perguntou por ti.”
“A sério?”
“Achas?!”

Mas, a coisa nem sempre corre bem. Há Dias duros em que se vai à ginástica e só se faz ginástica. Em que se passa uma hora, inteira, a dar no ferro, para depois voltar para o trabalho. Dias de ginástica pela ginástica. Dias de esforço, suor e lágrimas.
São os dias em que não vemos a Due Cupole.
Os outros, os dias em que ela está, também não são sempre iguais.
Há aqueles em que, mal começamos a descer a escadas para o balneário, lá damos com ela, no restaurante (que é por baixo das escadas) a ler os seus Abílio Neto com um prato de sopa à frente. São as visões de cima, muito, muito, favoráveis.
Há outros, em que a vemos quando saímos do vestiário a caminho da ginástica propriamente dita. São visões passageiras, por mais que se tente atrasar o inevitável.
Há, finalmente, dias de sorte, quando, a seguir a uma intensa sessão de ginástica, temos direito ao descanso do guerreiro. Uma mesa em frente à dela, um almoço inteiro para a observar, e ela sozinha, debruçada sobre as sebentas, com um ar ingénuo, pueril e levemente melancólico de quem está a tentar aprender coisas complicadas.
“Venha mais uma tarte”
“A mozarella está óptima. Vou repetir.”
“Mais dois cafés!”
“Mas ainda não bebeu este.”
“Não faz mal, traga mais um.”
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